Velha cidade viva

É complicada a articulação entre a preservação e a vida da cidade. As cidades históricas nos remetem a um momento em que a relação de espaço e de tempo eram diferentes dos dias atuais. Sim, preservamos esses remanescentes da história como referência para o povo que a constituiu no tempo, mas também tornamos esses lugares atrativos ao turismo. Não só por uma questão de orgulho xenófobo, mas porque o turismo é uma atividade econômica compatível com esses espaços, de baixo impacto (via de regra) e extremamente dinâmico.
Há anos acompanho o ressurgimento da Cidade Velha, em Belém, como espaço cultural e as contra-argumentações da Associação Cidade Velha-Cidade Viva (CIVIVA) do impacto que determinadas atividades gera na rotina normal do morador desses sítios. Quem está a passeio, não estabelece vínculos; quem vem de fora não visualiza com profundidade as necessidades da população. Vivificar um espaço é uma expressão que muda de contexto conforme a pessoa que a conjuga e os sujeitos envolvidos.
Recebi por e-mail um longo texto e acompanhei o Danilo Gentili no CQC de ontem questionando o evento em comemoração ao dia de Tiradentes. Impossível não lembrar de Ouro Preto, na primeira vez que estive lá, final da década de 60: as estradas ruins garantiam uma certa reserva ao contexto local. Em compensação, tínhamos o espírito acolhedor mineiro nos abraçando em toda porta entreaberta, em todo cicerone que nos abordava, no ritmo e na alma das coisas. Quero crer que não tenha-se perdido de todo esse élan, mas não alimento ilusões de um congelamento no tempo.
Recebo notícias de Petrópolis, de onde também trago tenras lembranças e tristes notícias: o turismo impõe uma outra relação com a cidade, um distanciamento que impede que os cidadãos possam circular livremente, apropriando-se dos espaços que lhe são devidos.
No Rio de Janeiro, se apresentar documento de identidade comprovando a naturalidade ou residência carioca, tem desconto no trem do Corcovado, nos períodos de baixa estação turística. Não é a situação ideal, é claro...
Pelourinho foi uma intervenção tecnicamente muito criticada por conta da gentrificação que ocorreu: a população tradicional residente deu lugar a um cenário de pousadas e restaurantes. E a vida desse lugar?

Sempre me pergunto: para quem estamos preservando o patrimônio cultural, espacial, arquitetônico, contextual de uma cidade? Enquanto não conseguir uma resposta definitiva, continuo na minha busca.

Comentários

Postagens mais visitadas